Com a libido apaziguada e as carnes doridas, a razão
pôde enfim sobressair e deixar o bom senso governar um pouco. Levantei-me, esqueci
por um dia a necessidade de economizar em tudo a toda a hora e enchi a
banheira. Precisava dum longo e retemperador banho de imersão, que se revelaria
milagroso.
Depois do almoço - uma salada rápida - agarrei-me ao
trabalho. Desta vez consegui abstrair-me o suficiente do conteúdo e focar-me na
forma. Não foi propriamente fácil ‘’apanhar’’ o estilo por vezes confusamente
embrenhado da Rosa, que para chegar dois metros ao lado de onde estava, levava
o leitor a dar uma volta à Europa passando pela Ásia e visitando a Oceânia.
A minha primeira reação foi de cortar, mas tudo o que
lá estava fazia falta – mais cedo ou mais tarde. Resumindo e baralhando, a
tarde lá se passou sem que eu me tivesse portado mal.
Quando o Nando chegou, e animado pela noite anterior,
mostrou como estava desejoso de, o mais rapidamente me apanhar novamente na
cama. Eu não lhe podia espetar novamente com a batida desculpa da dor de
cabeça!
Sabia bem porque estava assim; porque quis! Não
podia agora fugir com o rabo à seringa; tinha mais era que me aguentar e cumprir
com o meu dever de mulher.
Ajudou o tinto que ele abriu; sacana sabe bem o efeito
que dois copos exercem sobre mim, e o que três exercem sobre as minhas coxas. Como
ele costuma dizer zanga-as uma com a outra e afasta-as cada uma para seu lado.
Deixei rolar, afinal uma mulher é uma mulher, certo?
Por me ter sentido assim para o choucha, depois de
levantar a mesa, chegou-se por trás de mim e apoiou-me as mãos enormes e mornas
nos meus ombros. O seu sorriso dizia-me o quanto sabia no que aquele toque resultava.
“Ai mãe…”
“Que queres tu agora à senhora, deixa-a lá estar
sossegada, que ainda lhe dava uma coisa se visse bem o que te está para
acontecer.”
“E o que é que me está para acontecer?”
“O mesmo que acontece a uma lagarta!” Acentuou a
massagem e fez-me suspirar. “Tu aqui, agora és como uma lagarta, uma Lady; e as
minhas mãos vão iniciar a tua metamorfose naquilo que te vais acabar de transformar
no quarto, como numa linda e deslumbrante borboleta, na mais fascinante das
putas.”
“Ai então tu queres-me puta, é isso?” Fiz-me de novas,
exagerando na minha admiração, como se dourado dos meus canelos me tivessem
efetivamente retardado a compreensão. “E para que é que tu quererias uma coisa
dessas?”
“Para fazer cá umas coisas que me ocorreram!”
“Ohh! O quê?!”
“Umas coisas… não dão para explicar. Eu depois
mostro-te.”
“Então, mas… e achas que uma puta é que é boa para
fazer essas… coisas de que falas? Porquê uma puta? E uma puta como, fina?”
“Não! Fina, não; reles. Uma daquelas bem ordinárias
capazes de tudo!”
“Que horror. E queres a tua mulherzinha assim?”
“Sim!”
“Então e depois? E se me acontecer o que acontece às
borboletas? Elas não se remetamorfozeiam novamente em lagartas, pois não? E se
eu nunca mais deixar de ser puta?”
“Deixas, deixas; quando saíres do quarto, voltas a
ser uma Lady!”
“Ohh… que chatice.”
Rebentámos numa gargalhada incontrolável que o nosso
olhar mútuo fez esmorecer. O Nando pegou-me mo pescoço e inclinou-se. Parou com
a cara a centímetros da minha e fixou-me intensamente. A sua mão quente, que me
agarrava forte a base da nuca, o lume do seu olhar e o calor do vinho, tudo se uniu
para me derreter em desejo que senti aflorar na face e humedecer na intimidade.
E é engraçado como o corpo e principalmente a mente
duma mulher é; talvez por estas e por outras é que a Rosa Mateus acredita e
defende que somos nós o sexo forte; uma mulher aguenta tudo! E uma puta, em
última análise, não é outra senão uma mulher com M grande.
Por mais que passe um dia inteiro a perceber como um regimento de marujos regressados duma comissão de ano e meio em alto mar matam as saudades de mulher, arranja sempre forma de dar um sprint final se o marujo tímido e envergonhado lá mudar de ideias e afinal também quiser a sua lasca.
Não seria eu agora que desgraçaria o género e me armasse em bonequinha com frenicoques e não me toques!
Por mais que passe um dia inteiro a perceber como um regimento de marujos regressados duma comissão de ano e meio em alto mar matam as saudades de mulher, arranja sempre forma de dar um sprint final se o marujo tímido e envergonhado lá mudar de ideias e afinal também quiser a sua lasca.
Não seria eu agora que desgraçaria o género e me armasse em bonequinha com frenicoques e não me toques!
Englobei a sensação de maceramento e dorido que me
acompanhara durante o resto do dia, e vi-a como ajuda a entrar no papel em que
o meu marido me queria; afinal, puta que é puta, deve passar a vida inteira a
sentir aquela sensação.
“Nando; amor! Sabes que há um ditado muito antigo,
acho que é egipcio ou bretão, ou se calhar é azteca – que é tudo a mesma coisa –
que diz que devemos ter cuidado com aquilo que desejamos; às vezes acontece!”
Levantara-me e acabei de falar já de pé, a olhá-lo nos
olhos e mordi o lábio inferior marota, passei-lhe a mão ao de leve no seu triângulo
dos prazeres, dando-lhe o tempo suficiente para acusar o toque e reagir-me na
ponta dos dedos. Tenho a certeza de que perdeu ali no meio, um dos passos
corretos na sequência inspira-expira-inspira-expira… até se engasgou! Deixei-o
a ver se percebia ao certo o que se tinha acabado de passar ali, enquanto ficou a ver-me afastar a rebolar sensualmente o rabo da sua perdição.
Quando chegou ao quarto, depois de fazer a sua ronda
habitual pela casa a verificar as portas da rua, eu já tinha posto o nosso CD a
tocar baixinho. Há coisas que fartam e aborrecem, mas as nossas músicas são as nossas
músicas. E o Purple Rain, por mais batido,
cliché, velho ou o que lhe quiserem chamar, será sempre o nosso Purple Rain de sempre. Eu estava nua sobre a cama, tapada só com o lençol. Tinha uma perna esticada por baixo do lençol, e a outra, fletida, aparecia destapada; eu abanava-a dum lado para o outro explicitamente sugestiva da
minha propensão a abri-la. Subiu para a cama e eu fi-lo parar com o pé,
apoiado no seu peito.
Apanhei-o com uma surpresa que ele não disfarçou. Pensou que eu
estivesse a brincar e tentou forçar-se, em vão pois só me fez ser ainda mais
veemente na minha intenção:
“Diz lá então, querias uma puta não era?!”
“Sim!” A voz tremida não enganou. Ele gostara do que
experimentara na nossa noite anterior, e vinha à procura de mais.
“Então prova-o!”
“Como?”
“Faz-me puta. A tua puta!”
“Como?!”
“olha que pergunta! É bem simples: o que é que uma puta faz durante o dia?”
“Fode.”
“E como é que fode?”
“Como uma louca, à bruta.”
“E era assim que me querias?”
“Ss…im!”
“Ss…im? O que é que é isso? Fala, como um homem!”
Ele parecia não me reconhecer. Caramba, até eu não me reconheci!
“SIM!”
“Assim sim! Então vê como uma puta que fodeu o dia
todo está ao fim da noite!”
Ele puxou o lençol lentamente, e o seu deslizar pela
minha pele ao descobrir-me as mamas, a barriga, e por último a minha perna
esticada – que eu entretanto fui abrindo – obrigando a ponta do tecido acabar
por me roçar entre as coxas e no meu clitóris já intumescido, fez-me arrepiar
desde a nuca até à ponta dos dedos dos pés.
Esperei que ele caísse de boca, esfomeado, para lhe
apoiar as minhas mãos bem abertas na sua cabeça, guiando-o e puxando-o leve mas
determinadamente, e só depois fechei os olhos.
Perdi-me novamente num mundo como o que a Rosa Mateus
descreve, com visões surreais como se do fundo dum mar onde por entre algas
ondulantes vislumbrasse uma das suas passagens em que provava o mais divino dos
prazeres: o devorar em absoluto abandono pela boca dum marido ensoberbado pelos
cornos!
Tinha que aproveitar o estado “quero-lá-saber” em que
ele estava para mandar todo o carvão que conseguisse para aquela fornalha!
“Gostavas, não gostavas? De me comer assim depois de
eu ter estado com outro homem?”
Uma réstia de dignidade de macho embrutecido ainda tentou
reagir, e eu acabei por afogá-lo numa nova vaga de cio em estado liquido que
senti escorrer de mim diretamente para a sua boca.
“Gostavas. Eu sei que gostavas, não precisas de me
responder doutra forma; eu já percebi.”
Presenteei-o vindo-me e contorcendo-me como uma cabra
alfeira. Saber perfeitamente que era daquele momento que ele estava à espera
para vir rentar o que o barrava de vir com todo o seu poder e pujança para me
vergastar mental, e fisicamente devastar pelo desaforo, ainda acabou por me
despoletar uma última viagem – mais rápida é certo – aos arredores do Olimpo.
Apanhou-me naquele momento em que tudo começa a parar
de rodopiar, mas em que ainda estamos zonzas. Não reagi; não o conseguiria
mesmo que o quisesse, quando ele se enterrou furiosamente em mim e me demoliu a
intimidade em estocadas de deleite que, em crescendo, me levaram a acompanhá-lo
num explosivo e memorável como os são sempre até ao próximo, orgasmo simultâneo!
Quando por fim nos separámos, e eu senti por fim aquela
lancinante dor nos tendões das virilhas que uma mulher sente depois de bem
montada – sinal derradeiro de que o foi efetivamente! – e me aninhei nos seus
braços, lembrei-me daquele casal de personagens do Ribatejo Ardente. Quando a
mulher assim se aninhou também e adormeceu a pensar como diria o que queria
dizer ao marido.
À falta de mais coragem, disse-lhe baixinho.
“Eu amo-te. E é bom ser a tua puta.”
“Eu sei. E eu também te amo!”
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"A maior desgraça que pode acontecer a qualquer escrito que se publica, não é muitas pessoas dizerem mal, é ninguém dizer nada." Nicolas Boileau